"Outra vez com essa cara moço?" perguntou...
"Parece que não me conheces outra, né?"
"Então que é que se passou desta vez?"
"Lembras-te da miúda dos caracóis?"
E exorcizou-a em palavras, como se o facto de a descrever o obrigasse a admitir o absurdo que era pensar em alguém de forma tão grande, tão pura, tão amável...
E contou tudo, desde o sorriso que ela lhe dera, como o sorriso que ele não lhe conseguira dar, o caminho do nervoso miudinho à paixoneta ao incómodo e ao inevitável nada. Mais uma que se interessara fazendo-o imaginar que as coisas poderiam melhorar e ficar boas, mais uma que perdera o interesse e se afastara mesmo que ele não a quisesse prender, ampla história da sua vida. Ampla história da vida de todos os que estão pré-destinados a nunca serem mais do que tentativa.
"E o mais surpreendente é que eu nem a queria assim tanto" acabou por confessar "mas a ideia de voltar a ter alguém sorriu-me tanto..."
"Deixa... outras aparecerão rapaz...aparecem sempre..."
"Pois, mas era mesmo dela que eu gostava... a rejeição tem sempre este efeito, amplifica sempre o nada que sentíamos ao ponto de parecer alguma coisa..."
"True son, so true..."
E a Lua de amarela passara a branca lá em cima e o mar acalmara o suficiente para um mergulho às 3 da manhã...
_______________________
A ouvir:
João Gilberto
"Insensatez"